Embora o senso comum acredite o contrário, a área de exatas não é tão exata assim (as equações de limites que o digam). A vida não poupa esforços em se mostrar contraditória ao permitir que um mesmo evento possa ser observado por vários pontos de vista. Igualmente diferentes. Igualmente verdadeiros.
Este fenômeno também está presente no assunto que vamos abordar neste artigo: Migração de software. Polêmico por natureza, o assunto sempre levanta controvérsias entre cliente e fornecedor de software. Mais ainda quando a figura de cliente e fornecedor se confundem em uma só. As causas da dissensão são as mais diversas. O ponto pacífico entre as partes é: vai ser gasto algum dinheiro.
Longe de querer esgotar o assunto, em um exercício de empatia casado com as experiências anteriores que tive (algumas boas, outras nem tanto), quero oferecer aquele que imagino ser o ponto de vista do cliente e o ponto de vista do fornecedor de software. E convido você, de antemão, a contribuir também oferecendo os seus comentários.
Como ele sempre tem razão (e quando não tem, ajudamos ele a ter), vamos começar com o cliente.
A migração de software do ponto de vista do cliente.
Quem mexeu no meu queijo?
Toda empresa tem aquele funcionário que está há anos na mesma posição. Que já decorou todas as teclas de atalho e que sabe, mecanicamente, a execução de todos os comandos do sistema. Com certeza é um funcionário veloz. Quem sabe ele tenha construído uma imagem positiva perante os seus colegas de trabalho. Encontra-se na zona de conforto. E não quer sair de lá.
O problema de permanecer na zona de conforto é que, fatalmente, sua empresa e este funcionário estarão fechados ao horizonte de aprendizado. Aprendizado que pode levar a novas possibilidades. Como a de produzir mais e melhor no mesmo período de tempo. Como atender melhor o “cliente do cliente”, fornecendo dados na tela que são mais relevantes a operação em curso (os últimos sabores de pizza pedidos, por exemplo).
Por mais cuidadosa que seja a equipe de UX, haverá o desafio será sair da zona de conforto. Não apenas porque alguma caixa de texto mudou de lugar, mas algumas pessoas podem se sentir “fiéis” à interface anterior. Outras podem ter medo da necessidade de reaprender aquilo que ele já tomava como domínio. No entanto, o que a equipe de UX faz de melhor é trabalhar a usabilidade, ergonomia e a experiência de uso de um produto. Ao migrar de software, bem mais do que uma tela bonita, você terá interfaces sadias e inteligentes para o usuário. Vencida a curva de aprendizado, os ganhos em produtividade podem ser até maiores.
Em time que está ganhando….
Talvez o seu software hoje esteja cumprindo bem as tarefas que lhe cabem: Entrega os relatórios, faz os movimentos financeiros, exporta para o Excel… Todo mundo sabe mexer. Tudo bem que não está na internet, nem consigo acessar rapidamente as coisas remotamente. Mas o velho guerreiro está lá, firme e forte, aguentando o tranco! Em time que está ganhando não se mexe.
A conhecida máxima futebolística não se aplica ao mundo do software. Computadores evoluem em poder de processamento exponencialmente. A arquitetura dos componentes internos também muda. Você tem certeza que o software que está utilizando faz o melhor uso possível do seu parque de máquinas? Você tem certeza que o seu software possui proteção contra acessos maliciosos e é capaz de guardar, com segurança, os seus dados?
A Nuvem e sua sopa de letrinhas revolucionaram a computação mundial. Se ontem falávamos de acessar a empresa da tela de um microcomputador, hoje, ao mesmo tempo em que toma uns bons drinks na praia, você pode tomar decisões a partir de um relatório carregado no celular. Falamos de interfaces de comunicação que, além do teclado, também utilizam a voz como mecanismo de entrada de dados. As pessoas querem interagir com o seu produto através de todos os meios disponíveis. O seu software atual permite isso?
Money! Money! MONEY!
Chegamos a principal dor: o bolso. Seja comprado, produzido internamente ou alugado, o software anterior pode ter custado caro. Alguns anos de investimento, talvez. Aos olhos do cliente, o software é bem completo. MESMO! Tem até alguns módulos que nem sabemos se são utilizados. Mas estão lá, disponíveis para quando a gente precisar. Por que gastar dinheiro em uma aposta? Por que ter a dor de cabeça de montar toda uma equipe para fazer aquilo que já está pronto?
O princípio de Pareto, mais conhecido como a regra de 80/20, diz que para muitos eventos, 80% das causas advém de 20% dos efeitos. Traduzindo para o nosso contexto, apenas 20% do seu software é realmente utilizado. Os outros 80% é bem pouco utilizado ou está em alguma planilha do Excel perdida por aí. Sabe o pior? Você certamente está pagando por esses 80%. Especialmente se a sua aplicação é um monolito. Você está gastando com espaço em disco, manutenção, processamento. Em termos gerais, você já está jogando dinheiro fora. E a migração de software vai te ajudar a estancar esta sangria.
E se vamos falar em dinheiro, precisamos falar de contabilidade. Nesta área, software é Ativo Intangível e não Passivo. Ou seja, o software é parte importante na composição do valuation da empresa. Durante o valuation, além das funções automatizadas e o impacto na produção, o software também é avaliado de acordo com a atualidade da tecnologia utilizada. Os níveis variam de acordo com o ramo, mas para que você tenha uma ideia, segundo o site ContabNet, o peso das soluções e tecnologias utilizadas pela empresa pode chegar a 50% no valuation de uma startup. O seu software antigo está te deixando mais pobre.
E qual o meu papel, enquanto cliente, no processo de migração?
Nos modelos tradicionais de produção de software, o analista visitava o cliente, colhia informações, fotos, entrevistas. Tempos depois, regressava com um produto que correspondia a sua interpretação das necessidades da empresa. Não raramente, muita coisa dava errado. Os requisitos mudaram, ou houve alguma confusão de entendimento. Nova análise, novos requisitos, novas versões. Cliente e Fábrica de software eram entidades separadas, com pouca comunicação.
Dentre as melhores mudanças trazidas pelo movimento ágil está a aproximação entre cliente e fornecedor. De um lado, temos o cliente que conhece melhor as suas dores que ninguém; ele realmente sabe o que quer. E do mesmo lado temos o desenvolvimento que, quer por experiências anteriores, quer por estudo teórico, também tem conhecimento do negócio. Essa junção de conhecimentos promove a produção de produtos maduros e duráveis, juntando necessidade e qualidade.
Outro ganho advindo dessa proximidade é a possibilidade de errar rápido e errar menos. Não é preciso aguardar a entrega da feature para que o cliente faça a aprovação. Como ele está incluso no cotidiano da produção, é durante a produção que os erros vão ser percebidos e já ajustados. As chances de acertar, quando se erra rápido, são maiores.
É evidente que o cliente possui mais inseguranças em relação ao processo de migração de software. A fonte do medo e ansiedade é o desconhecido. Justamente por isso, este processo precisa ser construído em conjunto e com foco na transparência. Por isso acredito tanto na força de um projeto bem feito e de escrita conjunta. Como podemos perceber pelo pouco que foi levantado nesse artigo, a migração de software pode, além das melhorias explícitas, representar economia e ganhos para a empresa! O que você está esperando para avaliar o seu software?
Em tempo, como eu disse no começo, essa é uma conversa com pelo menos dois pontos de vista. No próximo artigo, prometo trazer o outro lado da moeda: Como é a migração de software para o fornecedor? Como é a migração de software para quem consome o próprio software que produz? Espero você lá!
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